quinta-feira, 31 de julho de 2008

                                                                
João Ninguém da Silva

Levanta pra cuspir o jejum de ontem à noite
Fila a média com pão na padaria da esquina
E vai vender flores, lindas cores, ainda vivas,
para os mortos do cemitério do comércio.
Esse é o João e, a cargo do seu nome, essa é sua sina.
Mal cabem seus pés no chão do ônibus,
cuja lotação é sempre ilimitada.
Mal cabe em si o João de desgosto ao encontrar uma paixão amarradeira:
uma antiga namorada
Um filho pendurado em cada braço, um guardado barriga adentro
e talvez, quem sabe, diz a regra, um planejado em pensamento.
Como se sua vida fosse o paraíso e o pão de cada dia fosse o vento.
E João desdenha o fato e lhe pergunta a hora.
Mas a mulher não o escuta e, se o escuta, o ignora.
Talvez reconhecesse naquele rosto envelhecido uma cicatriz pra vida inteira,
quando o João ainda novo, transformara em meta uma simples brincadeira,
pois pra matar a fome e pra ganhar a vida, João perdeu o rumo e foi bater carteira.
Mas hoje ele vive de quem morre, tendo as flores como o elo dessa trama.
E de quem a vida leva sete palmos terra abaixo,
João Ninguém da Silva segue a sorte do seu rumo,
levando pouco a pouco o troco desse drama.
Há quem diga que ele ainda toca a vida para a frente,
e acredita que um dia deixe de ser João Ninguém,
mas com as flores no caminho e levando o Silva com honra
ainda vire nessa vida um presidente.

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