quinta-feira, 31 de julho de 2008

Uma canção em tempo presente

Quem fará a canção dos nossos tempos, anos 90, anos 2000?
Que traduza a transparência cega dos nossos dias, que ensine aos filhos do futuro a nostalgia de ouvir um passado que não te pertence.
Que fale, como falaram um dia, nas entrelinhas, sutil e avidamente, de um Brasil anos 60, de um exílio, do silêncio lúcido dos loucos nas esquinas, a testemunhar uma guerra vã politizada.
Haverá uma canção para falar da política dissolúvel e teatral, dos poucos heróis a morrerem honrados ou de índios queimados pelas ruas da capital arquitetada por um sonhador?
Ouvirão, aqueles que estão por vir, uma melodia a falar de um presidente estadunidense desprezado pelo povo da nação mais patriota do mundo? Ou de uma guerra teleguiada pelos gritos injustos das incertezas? Ou de decapitações em série transbordando o mar invisível da internet qual cartas de amor nos tempos em que amar não era teatro e nem tampouco brega?
Se ouvirá, quem sabe, no bar da esquina, a narrativa em tom maior de um ex-metalúrgico no trono presidencial, viciado em auto-publicidade pseudo-modernista trtavestida em bonés coloridos, skates radicais, guitarras e embaixadinhas frustradas?
Ou de crimes altamente organizados nas favelas e no senado, como já se ouviu um dia.
Alguma canção, qualquer que seja, martirizará o Sol que seca os farrapos em um varal das novas favelas?
O mesmo Sol a enrubescer o rosto de um papa já trêmulo e corcunda a pedir perdão, rodeado pela luxúria áurea dos tiranos, proferindo inconsistente seu derradeiro latim.
Há que se fazer a canção dos nossos tempos, antes que o sol se ponha, antes que o tempo passe, e já não nos sobre tempo para ouvir uma canção

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